Capítulo XI
QUadro de
valores
Do senado
dos honestos
Introdução
Na Democracia Perfeita Utópica do Autor, existe um Senado dos Honestos que estabelecerá o quadro de valores do Inconsciente Coletivo “atualizado” para o país, independentemente de ideologias políticas ou credos religiosos.
O culto da verdade, a tolerância, os valores e virtudes tradicionais, mas a abertura para o futuro são critérios de base. O desiderato deste Órgão designar-se-á Ética Constituinte. [1]
Como dissemos nesse projeto de Democracia Utópica, o Senado dos Honestos é constituído, em assembleia geral, por um representante idóneo de cada autarquia, eleito pelos seus habitantes. Como dissemos também, estes valores sublinham só procedimentos éticos ou morais. Não são leis escritas obrigatórias.
Os valores serão revistos periodicamente, para atualização.
Exemplo de um quadro ético de valores
• O culto da verdade; • a honestidade; • a honra; • o dever nos compromissos assumidos; • a tolerância com raças, credos e opiniões; • o culto do conceito fundamental de família, nomeadamente as lealdades física e psíquica monogâmicas, heterossexuais; • o encantamento e cuidado com as crianças; • a coragem masculina; • o pudor das mulheres; • a veneração do símbolo mulher‑mãe; • a igualdade de oportunidades, incluindo de género; • o mérito com prémio assertivo; • o respeito pelo património seja de quem for, nomeadamente o nacional; • o dever com a comunidade; • lembrar a herança social, naquilo que os antepassados nos deixaram e pensar nos vindouros; • o amor pela nacionalidade; • as virtudes humanas sublinhadas por Platão: sabedoria, coragem no infortúnio, temperança, justiça; • as virtudes teologais do catecismo da Igreja Católica: fé, esperança e caridade na ação social aos desvalidos.
Apreciação sobre os valores éticos do quadro
Honestidade.
Talvez em consequência do passado turbulento e variado desta zona da Península Ibérica: (Neandertais, Homo Sapiens, Iberos, Celtas, Celtiberos, Fenícios, Gregos, Cartagineses, Romanos, Visigodos, Muçulmanos e, finalmente, Reinos Cristãos [2]), a adaptação dos que eram nativos, depois submetidos aos novos ocupantes, fez-se muitas vezes com luta, sempre com algum artifício. Exemplo típico: os moçárabes, os cristãos-novos, etc.
Esse artifício parece estar presentemente no substrato do povo português: é o chico-espertismo que ilude a lei como pode, que foge aos impostos, que é corrupto por idiossincrasia, que dá as suas `facadinhas´ frequentes na lealdade sexual.
Numa comunidade sã, deve haver confiança mútua generalizada para se conseguir a comunhão de esforços. `O culto da verdade, a honestidade, a honra, o dever nos compromissos assumidos´ são valores que corrigem essas más tendências já inatas.
Tolerância
A intolerância matou Sócrates, matou Jesus, fez crematórios em autos‑de-fé em nome do «manso e humilde de coração», matou seis milhões de judeus no Holocausto, divide o que o amor uniu. A tolerância foi recomendada já na Antiguidade clássica: • Protágoras (590 a.C): «Aquilo que vale em determinado lugar não deve valer, necessariamente, em outro.» (Wikipédia). Também recomendado por Iluminados das religiões: • Jesus: «O que quiseres que vos façam os homens, fazei-o também a eles» Mat. 7, 12; • Maomé: «Se observarem a doutrina da vossa crença, seguireis o caminho da salvação», Sura 2, 137 [3]
A tolerância é a via sensata que conduz ao diálogo construtivo, à busca da concórdia, à paz.
A família heterossexual
A família reprodutiva heterossexual: pai, mãe, filhos é a estrutura da sociedade e a projeção para o futuro. Deve ser considerada como valor supremo em relação a qualquer outra união humana, mesmo unida pelo amor (que deve sempre ser respeitado, esteja onde estiver, como um dos sentimentos sublimes da vida).
A lealdade é o cimento da união. Numa ligação sexual, a deslealdade destrói-a, porque a ligação corporal é a intimidade máxima que se pode ter com alguém e, no critério monogâmico habitual humano, anseia-se que seja compartilhada em exclusividade com a mesma importância, mesmo só em união de facto. Se desejares uma mulher que esteja unida com outro homem, já estás a cometer adultério, disse Jesus. Se fizeres adultério, mereces 50 chibatadas, sentenciou Maomé.
Outra coisa é o sentimento, impulso subliminar: “O amor acontece”, diz o povo, “eu tenho dois amores, qual deles eu gosto mais” entoava o cantor. A tolerância pode admitir a poligamia espiritual desde que não afete “em nada” a relação monogâmica estável (a instável está predisposta à mudança). O problema é que “o acontece” de um sentimento profundo extramatrimonial pode instabilizar um casamento estável, como é frequente, e, logo, deve-se fugir desse risco.
Encantamento e cuidado com as crianças
As crianças são a projeção da vida no futuro. É uma das leis da Natureza cuidar da prole para que a vida continue. O tempo em que se assiste ao desabrochar dessas novas vivências, a surpreender-nos pela rapidez da originalidade, são os melhores anos da nossa vida.
A coragem masculina
Perdoa-se a um varão que tenha medo, pois a ousadia em excesso pode ser temeridade; não se perdoa que se acobarde. Deve enfrentar uma luta de que a sua honra varonil lhe diga de que dignamente não pode fugir, se há alguma esperança de sucesso. Contudo, se essa esperança for ínfima, a lei da Natureza a que um animal acossado segue normalmente: “ou luta ou fuga” é também masculinamente válida.
A não ser que esteja disposto a cair no seu campo de batalha, qualquer que seja o resultado final, por ser essa a sua missão, como, por exemplo, num militar. E nesta eventualidade, a coragem também pode ser notável numa mulher disposta a morrer na sala de partos para dar vida ao sangue do seu sangue. Mas este sacrifício supremo, para se considerar heroico, tem de ser um acto de vontade e não um dever imposto, em mobilização obrigatória, pois, então, é escravatura.
O pudor nas mulheres. A mulher-mãe
O povo diz, de uma mulher sem pudor, que é uma desavergonhada. O intercurso físico é bem diferente nos dois géneros. No feminino, pode haver a hipótese de uma gravidez ou ser mais suscetível ficarem patogénicos. O seu aparelho reprodutor é um sacrário onde só entra quem o merece; mas que parece deixar de o ser se, na sua atitude ou procedimento, a mulher der a ideia de libertina.
Levanta-se o problema nos casos em que mulher aluga o sacrário, como nas ditas trabalhadoras sexuais. Ora, a pergunta que se pode fazer é: “qual a diferença em relação aos mercenários nas guerras?” Nos dois casos, alugam o sagrado no corpo: no mercenário, até a própria vida. A condição nessa indiferença pelo sagrado individual é que não sejam afetados terceiros: no mercenário ficar estropiado a cargo de outras pessoas, na trabalhadora do sexo não ser mãe, para respeito dos filhos e do símbolo maternal.
A mulher-mãe é a vestal da vida humana. Deve estar num pedestal de veneração, como símbolo do maior amor do mundo. Na Democracia perfeita do autor, a mulher-mãe tem direito a um vencimento social enquanto, como doméstica, cuida dos filhos de tenra idade.
A igualdade
Não se defende a igualdade completa entre as pessoas. Esse critério é contranatura, pois, como temos dito, violenta a Natureza, que baseia a evolução na diversidade. Do ponto de vista económico, defende-se um apoio social aos desvalidos e uma limitação da posse na riqueza individual escandalosa.
Se não se apoia a igualdade económica, ...defende-se a igualdade de oportunidades, sem distinções de nenhuma espécie, nomeadamente de género. Contudo, se as mulheres são protegidas na sua qualidade de mulheres-mães, também devem suportar a sua condição feminina naquilo em que têm idiossincrasias peculiares (mênstruo, maternidade, por exemplo), e é natural que se prefiram os homens onde forem mais adequados (maior resistência física, maior disponibilidade permanente, etc.). Sublinha-se que, no que se refere à competência, na generalidade não deve haver distinção de género.
Note-se que na igualdade de oportunidades se levanta o problema da diferenciação à nascença com as heranças. Marx era drástico: com a sua medida 3 “Abolição da herança”, pois pretendia conseguir a completa igualdade de oportunidades à nascença e pela vida fora. Mas foi estultícia, porque os filhos da nomenclatura eram (e são) sempre bafejados. Não se pode eliminar completamente a herança porque se retira o incentivo da superação para de nós deixar memória; ...o que se deve é proporcionar as mesmas condições, com ajuda social aos que ficam em desvantagem.
O lema marxista “De cada um segundo suas capacidades, a cada um segundo suas necessidades” também é contranatura porque atrofia as capacidades. É o critério errado, evolutivamente, das taxas progressivas no rendimento do trabalho, pois desmotiva os mais capazes. Inversamente, o lema na Sociedade Perfeita Utópica deve ser “a cada um, com progressivo prémio de mérito, segundo os resultados, e com assistência social aos mesmo desvalidos”.
O mérito com prémio assertivo
É esse o critério geral com que se avaliam os resultados pessoais, por exemplo, nas notas das escolas, no vencimento no trabalho, na consideração pessoal. Não se percebe por que razão a quem é reconhecido maior mérito no vencimento do trabalho se apliquem taxas que castiguem esse mesmo mérito, pois é uma ação que contraria o próprio princípio natural de premiar o mérito. A medida 2 de Marx: “Imposto fortemente progressivo” tinha como objetivo retirar toda a propriedade individual centralizando-a no Estado. Os cegos ideólogos generalizaram-na, até ao empenhamento individual: “quem é só capaz de fazer um fato deve ter a mesma paga que quem pode fazer quatro” como aplicação do critério de generosidade formulado nas capacidades e nas necessidades acima indicado. Esta generalização é tão contranatura, que somos levados a pensar que, no seu conceito, talvez Marx tivesse querido significar: quem é capaz deve ajudar quem o não é, e tem necessidade dessa ajuda.
A ideologia foi abandonando o absurdo alinhamento por baixo, e, na própria China comunista, há hoje magnatas, China na qual Mao, no seu tempo, reclamava que a Rússia soviética tinha abandonado a ortodoxia marxista, e, ora, hoje, a China é a segunda potência económica do mundo... No prémio assertivo do mérito promove-se a emulação e a superação individual, critérios seguidos como uma obsessão, por exemplo, no vizinho Japão, dos samurais.
No quadro de valores considera-se que, inversamente, o prémio é progressivo com o resultado. Resultados excecionais (capacidades sem resultados não têm valor prático) devem ter prémios excecionais.
Respeito pelo património seja de quem for
Numa sociedade onde todos se roubam uns aos outros, é um covil de ladrões e não há propriedade segura. Numa comunidade sã, a propriedade é sagrada e nem há peculato ou corrupção, lá por os bens não serem de pessoa singular. A propriedade de todos é também sagrada.
O dever com a comunidade parcial e nacional
Quem não cumprir com a lei perde direitos nacionais e, naturalmente, está sujeito a punição imposta pela Justiça. Ora, se se deseja beneficiar das vantagens de pertencer a uma comunidade, deve-se respeitar mais do que as leis escritas dessa comunidade: respeitar também o seu quadro de valores. Pode-se cumprir com a Lei, mas ser `persona non grata´ por escandalizar a comunidade nos seus hábitos ou pensamentos expressos, e, assim, passar a ser um pária nessa comunidade. Por exemplo, a Lei não proíbe a ligação sexual com mais de um parceiro, mas o inconsciente coletivo repudia-o, considerando-o luxúria.
A herança social
As vicissitudes dos nossos antepassados podem servir-nos de exemplo para o presente. Além disso, é edificante lembrar os seus feitos excecionais para encorajamento no presente. O conceito de Pátria assenta em elementos agregadores que vão sendo transmitidos de geração em geração, como, por exemplo, o território, os costumes, a língua.
Pensar nos vindouros
Vai mal um país que malbarata os seus meios no presente, e que deixa um país depauperado, ou um débito a pagar pelos vindouros. Pais desnaturados que não cuidam dos seus descendentes...
É o que igualmente se verifica na manobra política de, muito mais numerosos na pirâmide demográfica invertida, os grisalhos se rodearem de privilégios, em detrimento dos jovens, alguns obrigados a emigrar.
Nas leis da vida e num caso de vida ou de morte, devem ser os mais velhos a serem sacrificados, sentenciou Carrel. Ora, são os jovens na flor da vida que os ditadores de todos os tempos obrigam a ir para carne de canhão nas guerras.
O amor pela nacionalidade e a integração no mundo
O dever com a comunidade obriga a que nos centralizemos na defesa da Nação, que nos orgulhemos dos feitos dos nossos heróis, incluindo os desportivos, e, até, que combatamos pela Nação se ameaçada. Contudo, presentemente, há uma interação ampla e fácil entre todos os países, não só do ponto de vista das trocas comerciais benéficas, mas também no das comunicações imediatas e no da rapidez das viagens pelo mundo, em relação ao passado. Assim, agora faz parte da defesa da nacionalidade o saber manter uma boa relação com os outros países que nos sejam benquistos. Mais do que do desporto, a defesa da nacionalidade deve fazer-se com “fair play” com outros países em que estejamos em paz (sem esquecer o aforismo “Quem o inimigo poupa, às mãos lhe morre”).
Valores que elevam o espírito humano
Sabedoria
Em Platão, os governantes eram filósofos, tinham esse valor num primado da sabedoria. Extrapolando, não necessariamente um filósofo era governante.
Coragem
Os guardiães, em Platão, tinham como virtude necessária a coragem, um valor pessoal. A coragem é uma virtude «no meio das dores, dos prazeres, dos desejos, dos temores, sem jamais os abandonar» (A República). Extrapolando, é também a virtude da luta sem desânimo contra a adversidade ou no empenhamento por um objetivo penoso de alcançar.
Temperança
«A temperança é uma espécie de bela ordem e ainda a continência de certos prazeres e apetites, ..... ser senhor de si ..... diferente de ser escravo de si mesmo e licencioso.» (A República). É o valor pessoal de quem se orienta pelo necessário e só o suficiente. Então, sabe avaliar bem esses limites, não reduzindo o necessário e não exagerando o suficiente. Por exemplo, quem jejua enfraquecendo não tem o valor pessoal da temperança; quem se empanturra também não.
Justiça
É «o princípio que leva cada um a realizar a sua tarefa, mantendo-se nos limites que a sociedade lhe impõe» (A República). Se não se cumpre a lei, fica-se sob a alçada da Justiça. Segundo este critério, cumpri-la não é um valor pessoal mas um dever.
Mas há valor pessoal nas decisões pessoais justas, mesmo que rebarbativas. Cita-se a justiça de Salomão (Google): Num julgamento do rei Salomão, onde duas mulheres disputavam a maternidade de um bebé. Para descobrir a verdadeira mãe, Salomão propôs cortar o bebé ao meio e dividir entre elas (Uma justiça pessoal rebarbativa). Mas a mulher que se mostrou realmente a mãe, movida pelo amor, implorou para que a criança fosse entregue à outra a fim de salvar sua vida. Salomão declarou que a mulher que sacrificou seu direito pela vida do bebé era a mãe verdadeira (valor da justiça pessoal acertada).
Fé
Para a Igreja, ter fé é a virtude de acreditar na existência de Deus e confiar como inquestionável toda a doutrina estabelecida, como, por exemplo, na Católica, a virgindade da mãe de Jesus (há divisão na cristandade), a infalibilidade doutrinal do papa (já houve mais que um simultaneamente na cristandade), a Unidade na Trindade (católicos diferem de ortodoxos), etc.
Na generalidade, define-se fé como um sentimento: (Infopédia) «Crença absoluta na existência ou veracidade de certo facto; convicção íntima.» «Confiança absoluta (em algo ou em alguém); crédito».
A fé não é ciência, pois esta exige verificação experimental. Só na incerteza e no desconhecimento se pode falar em fé.
Não se pode atuar com base só na fé. Mas a fé no sentido de confiança é estrutural no relacionamento entre as pessoas. Quando se instala a desconfiança, quebra-se um elo da “ligação mental”, e esta fica logo comprometia.
Para a Igreja, ter alguém fé é uma virtude do crente no sentido do interesse da própria Igreja; ao passo que para uma pessoa, a fé dos outros em si passa a ser um valor pessoal: o de inspirar confiança. Valor extremamente sensível: muitas ações corretas podem ser esquecidas só com uma atitude incorreta, mesmo insignificante.
Esperança
Por esta virtude teologal na Igreja Católica, entende-se que, ante um desagrado, um infortúnio, um desespero do crente, a bondade de Deus trará compensação; e, se não for nesta vida, será no Além.
Define-se esperança (Infopédia): «Sentimento de crença no desenlace favorável de certa situação; otimismo».
Para o pessimista, é de esperar sempre o pior e, assim, evita de arriscar. Inversamente, o otimista sabe avaliar o lado positivo e arrisca. A vida envolve muitas vezes prós e contras. O valor pessoal da esperança está em conseguir lutar sempre pelos prós, sem esquecer o cisne negro de Taleb.
Caridade
A caridade converteu-se num preceito legal igualitário, obrigatório com Marx: abolição da propriedade privada, ou seja, deixava de haver ricos e pobres. Construir uma sociedade sem classes, rezava.
Os partidos socialistas não vão tão longe: limitam-se a aplicar a medida 2 do Manifesto de Marx: Imposto fortemente progressivo. Assim, retiram mais valor a quem tem maior mérito. Só que deviam fazê-lo à intemperança do património excessivo e perdulário, escandaloso quando há pessoas a sofrer na pobreza ...e não o fazem.
Jesus foi taxativo: Vende os teus bens, dá-os aos pobres e segue-me. Mas a Igreja não o foi: dizia que acumulava bens para maior glória de Deus. É facto, porém, que a Igreja pratica e recomenda a caridade, dado que a considera uma virtude. Tem valor pessoal quem se preocupa com os desvalidos.
[1] Este capítulo está publicado separadamente. Por isso, nele repetem-se muitos dos conceitos defendidos noutros textos.
[3] Repare-se na transcendência destes conceitos. Protágoras, cerca de três séculos a.C., já preconizava a liberdade de crenças e procedimentos entre as pessoas, o que presentemente se considera uma conquista moderna, do liberalismo, depois das trevas sociais das ditaduras até de pensamento. Jesus inova em relação ao preceito base da Tora Judaica: não faças o que não queres que te façam, pois Jesus aconselha a ação ativa: faz o que quiseres que te façam. Se na Palestina se aplicasse o preceito de Maomé acima indicado, não haveria tanta crueldade.